Falámos com os fundadores da Raize, Afonso Eça e José Maria Rego, sobre a introdução do novo Regime Jurídico do "Crowdfunding" (RJ). Leia a entrevista na íntegra.
Em que medida é que este novo Regime Jurídico (RJ) pode afetar a Raize e o funcionamento da bolsa de empréstimos?
A Raize é a primeira bolsa de empréstimos para micro e pequenas empresas em Portugal e nesse sentido pode vir a ser abrangida por este novo regime. Contudo, é importante percebermos que no caso português já existe hoje um enquadramento legal bastante abrangente para a atividade dos empréstimos coletivos. Isto leva-nos a crer que este novo regime agora aprovado pode atuar mais como um complemento às regras que já estão previstas hoje na lei.
A experiência noutros países diz-nos que alguma regulação específica pode ser positiva para o crescimento da indústria. Concordam com essa visão?
Genericamente, a introdução de regulação específica na indústria dos empréstimos coletivos tem tido um impacto positivo no número de investidores e empresas. Um bom exemplo é o Reino Unido, onde foi introduzida regulação específica pela primeira vez em 2014 com efeitos bastante positivos para a indústria.
Contudo, é preciso não esquecer que a regulação no Reino Unido surgiu quase 9 anos depois do aparecimento da primeira bolsa de empréstimos - ou seja, os legisladores e reguladores contaram com o contributo de muitos players e anos de experiência de mercado antes de definirem algumas regras. É preciso aguardar a concretização do regime por parte da CMVM para podermos compreender melhor o seu impacto.
Chegaram a contribuir para a elaboração deste Regime Jurídico?
Infelizmente não. Este regime foi discutido por inteiro em 2013 e 2014, altura em que ainda não estávamos em funcionamento. A elaboração do regime não contou com a visão e experiência de qualquer plataforma de empréstimos - o que é uma pena - porque a atividade das bolsas de empréstimos tem aspetos muito diferenciadores face às restantes modalidades e que importa ter em conta.
O registo e subsequente regulação e supervisão por parte da CMVM faz sentido para a atividade dos empréstimos coletivos?
O registo junto da CMVM pode ser positivo para a atividade mas é importante que não se criem demasiadas barreiras à entrada que possam restringir o acesso a novas plataformas (em especial, plataformas desenvolvidas por empreendedores portugueses) e condicionar o crescimento da atividade em Portugal como um todo. Já existem várias plataformas a nível mundial, ou seja, se as barreiras à entrada forem demasiado elevadas, isso pode inviabilizar que empreendedores portuguesas assumam o risco de criar novas plataformas de financiamento (ao invés de plataformas internacionais que já possuem recursos para tal).
Quanto ao crescimento da atividade, a imposição de requisitos de governance demasiado elevados ou limites de investimento muito restritivos pode condicionar a atividade logo à partida.
Fala-se muito da introdução de limites de investimento para investidores - qual é a vossa opinião sobre o impacto que esta medida pode ter?
A introdução de limites de investimento não é algo consensual entre as várias jurisdições e importa estudar os vários regimes onde já se implementou limites para perceber bem como foi feito. Por exemplo, no caso espanhol, os limites de investimento podem ser ignorados por vontade do próprio investidor. Isto é uma especificação que faz toda a diferença. No caso do Reino Unido - possivelmente o mercado mais desenvolvido e inovador nesta área - não existem hoje quaisquer limites de investimento.
No caso espanhol, os limites de investimento podem ser ignorados por vontade do próprio investidor. Isto é uma especificação que faz toda a diferença.
Acreditam que este meio de financiamento vai ficar mais transparente? E vai afastar ou vai trazer mais investidores?
Na Raize já adotamos as melhores práticas internacionais em termos de divulgação de informação e transparência, que vão em muitos casos além do que está previsto no novo regime agora aprovado. Nesse sentido, não esperamos que haja qualquer alteração.
Sobre o número de investidores, como o número absoluto de plataformas a operar ainda é reduzido o impacto positivo poderá vir essencialmente de uma maior promoção mediática desta alternativa de financiamento e investimento.
Sobre a Raize
A Raize é a primeira bolsa de empréstimos coletivos em Portugal, oferecendo uma alternativa de financiamento de baixo custo para micro e pequenas empresas com pelo menos 2 anos de atividade e uma situação financeira e tributária regular. Através da plataforma www.raize.pt, as pessoas emprestam diretamente às empresas, em condições mais favoráveis para ambas as partes.
Para os pequenos investidores, é uma alternativa que permite investir a partir de 20 euros e obter retornos acima de 6.0% (taxa calculada com base na TANB do universo atual de investidores). Não tem custos para investir e é muito simples de usar. Para as micro e pequenas empresas, que aqui podem pedir empréstimos até 50 mil euros, é uma alternativa à banca, mais rápida e mais barata.
O que são empréstimos coletivos?
São empréstimos diretos entre pessoas e empresas, em troca de um juro pago ao investidor. A ideia surgiu em Inglaterra em 2005, sob o nome de peer-to-peer lending ou marketplace lending. Nos EUA também já se recorre a esta forma de financiamento desde a crise financeira de 2007/2008. No entanto, continua a ser uma prática bastante inovadora a nível global. Estima-se que, desde 2005, tenha permitido financiar mais de 20 mil milhões de euros em empréstimos em todo o mundo.